sábado, setembro 23, 2006

CRÍTICAS DA BIZZ ESPECIAL NIRVANA - Pt 1

Claro que não ficaria de fora desse Mês Especial Nirvana as famosas “Críticas da Bizz”, seção onde republico os textos antigos da revista para termos um pouco da impressão inicial que determinado disco provocou. E, ‘começando do começo’, publico abaixo o texto, de autoria de Arthur G. Couto Duarte, sobre Bleach, a estréia do Nirvana, de 1989, mas que só foi lançado por aqui depois do sucesso alcançado por Nevermind. Bleach é o famoso álbum dos 600 doláres, e mostra uma banda ainda crua, mas que já mostrava que tinha algo de diferente das diversas bandas da cena underground americana no final dos anos 80. Canções como “About A Girl” e “Mr. Moustache” tinham aquela veia pop que reinou no disco seguinte. Faixas mais, digamos, podreiras, como “Negative Creep” e “Sifting”, devem ter assustado aqueles que começaram a curtir a banda com Nevermind e esperavam mais do mesmo no debut da banda. Como eu já conhecia esse lado punk do Nirvana, achei tudo muito bom, e Bleach se tornou rapidamente um dos favoritos aqui em casa. Introdução feita, falta só dizer que, no texto, o autor se refere ao vinil, já que a versão em CD contém tanto “Love Buzz” quanto “Big Cheese”, ambas tiradas do primeiro compacto da banda para a Sub Pop. Vamos ao texto da Bizz então:

NIRVANA – BLEACH (GEFFEN/BMG-ARIOLA)
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Divulgado no Ocidente por Schopenhauser, o termo “nirvana” remonta às noções do budismo, onde foi utilizado para designar a extinção do desejo humano – estado este que resultaria em bem-estar e gozo indescritíveis. Por outro lado, Nirvana também deu nome a uma das mais agressivas e iconoclastas formações da nova cena norte-americana. Hoje, os membros do grupo usufruem a mega-exposição obtida com Nevermind, mas foi em seu primeiro LP, Bleach (lançado em julho de 1989 pela Sub Pop), que conseguiram se expressar com intensidade máxima.
Bleach é a prova de que não há contradições entre os sentidos filosófico e musical da palavra. Em ambos, assim como na psicanálise (o “princípio do Nirvana” dos textos de Freud indicava uma ligação profunda entre o prazer e o aniquilamento), Nirvana alude a supressão total das excitações internas. E é justamente isso que Kurt Cobain e cia. parecem buscar, por exemplo, nas autodestrutivas “Swap Meet” e “Blew”, onde entregam-se à absoluta devastação física e sensorial.
Com o expert Jack Endino na produção, o LP conseguiu ser ainda mais cru e básico que Nevermind. Há instantes – vide o sabor “beatle” de “About A Girl” – em que o Nirvana sinaliza com a abordagem mezzo ruído mezzo melodia que adotaria no futuro, porém o que impera aí é a zoeira; uma sonoridade coice-de-mula, configurada pela absorção de resíduos do rock ‘n’ roll, dos acordes pútridos das bandas de garagem, da bizarria lisérgica e da atitude “search and destroy” (“procure e destrua”) dos punks e bangers radicais.
A edição nacional de Bleach traz a faixa “Love Buzz” (canção do grupo holandês Shocking Blue que havia sido o primeiro single do Nirvana) no lugar de “Big Cheese”. Outras curiosidades são a presença de Chad Channing – revezando-se com Dale Crover, baterista dos Melvins, em “Floyd The Barber” e “Paper Cuts” – e o fato de o guitarrista Jason Everman (que aparece nos créditos da capa) não ter tocado realmente no disco. Isso posto, vale dizer que, se Bleach não é necessariamente inovador, tem a seu favor uma inquietação há muito ausente do rock.
Arthur G. Couto Duarte

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