No começo dos anos 80 o heavy metal sofreu uma de suas maiores mudanças. Enquanto os grandes nomes da época (Iron Maiden, Judas Priest, Ozzy Osbourne etc.) inflavam o imaginário dos fãs com letras cheias de fantasia, músicos metidos em calças de lycra coloridas e palcos repletos de sacanagens cenográficas, uns malucos da costa oeste americana começaram a se destacar no underground, trazendo o gênero para o mundo real.
O figurino carnavalesco foi trocado pela roupa detonada do dia-a-dia: calça jeans colada ao corpo, camiseta de banda e tênis cano alto (fodidos e emendados com silver-tape). O discurso começou a mostrar preocupações sociais. Trocando em miúdos, desapareceu a distância que existia entre o palco e platéia. Herdados do punk rock, o mosh e o stage-dive passaram a virar costumes de lei nos pequenos clubes que acolheram a então nova geração de bandas.
O Metallica foi o grupo que mais se destacou nessa leva. Inovador desde sua primeira demo-tape (ainda com o guitarrista Dave Mustaine, hoje líder do Megadeth), o grupo estreou em disco com Kill Em’ All (1983). Nele, o Metallica acelerou as batidas, valorizou o trabalho das guitarras e tornou-se mais agressivo - não confundir com barulhento. Inicialmente, essa mistura foi classificada como speed metal. Mas pouco depois surgiu a expressão thrash metal, batizando o gênero que fez o heavy metal deixar de ser coisa de nerd pregossauro.
Três anos se passaram, o movimento migrou da Califórnia para a Europa e, quando deu pinta de que havia inovado o suficiente, veio Master Of Puppets. Aí, a coisa saiu de controle. Nunca tinha se ouvido sons assim. Os metaleiros - termo inventado pela repórter Glória Maria, da TV Globo, durante a cobertura do Rock In Rio, em 1985 - não acreditaram no que ouviram. Pesadas ao extremo, com um timbre grave, porém limpo, as guitarras formavam uma massa sonora impressionante (ouça a faixa "Disposable Heroes").
A partir daí, praticamente TODOS os guitarristas de metal tentaram chegar ao som que o Metallica tirou. Foram criadas várias lendas a respeito de como tirar um som parecido no estúdio - teve gente que chegou até a microfonar os amplificadores pela parte de trás. Até que descobriram o óbvio ululante: o segredo não estava no equipamento, nem em como utilizá-lo, mas sim na palhetada. Como dizem os guitarristas, na "mão direita". Master Of Puppets foi um divisor de águas. O Metallica aprimorou o estilo mostrado nos álbuns anteriores, com músicas mais trabalhadas, cheias de variantes. As melodias ficaram ainda mais marcantes e o grupo colocou um pezinho no mainstream. Agradava a gregos e troianos. Gente que gostava de metal tradicional, os radicais que só ouviam esporro e - principalmente - os que não curtiam metal passaram a consumir o som da banda.
Embora o Metallica tenha mais tarde ficado ainda muito maior, o thrash metal viveu seu melhor momento ali. O underground ferveu (nada a ver com a boiolice clubber) e novas bandas, clubes e festivais pipocaram no mundo inteiro.
Ano de lançamento: 1986
Produção: Metallica e Flemming Rasmussen
Faixas: "Battery" - "Master Of Puppets" - "The Thing That Should Not Be" - "Welcome Home (Sanitarium)" - "Disposable Heroes" - "Leper Messiah" - "Orion" - "Damage, Inc."
Master Of Puppets não foi só o ápice do thrash metal: abriu os olhos do mundo para o estilo. É, sem dúvida o melhor disco de heavy metal lançado nos anos 80, álbum que alavancou o Metallica para o mainstream. É importante também por ser o último trabalho do baixista Cliff Burton. Saindo de um show na Suécia no dia 27 de setembro de 1986, o ônibus que carregava o Metallica capotou e Burton (que extraordinariamente ocupava a cama do guitarrista Kirk Hammett) morreu no acidente. A banda se afastou, mas voltou um ano depois com Garage Days, um EP de covers que marcou a entrada do baixista Jason Newsted.
"Este disco revolucionou o jeito de se fazer heavy metal. Teve uma influência muito grande no próprio Sepultura. Principalmente no Schizophrenia. Na época, brincávamos dizendo que tínhamos um armário de riffs baseados nas palhetadas criadas pelo Metallica. Além disso, a atitude de Master Of Puppets é fantástica. Abrange assuntos mais reais, muito pouco vistos antes no metal." Max Cavalera
(Discoteca Básica, Bizz #147, outubro de 1997; texto de autoria de Robert Halfoun)