sexta-feira, março 07, 2008

AS FACETAS DE BOB DYLAN (PT. 3)

O CAIPIRA ESCLARECIDO
Discografia: John Wesley Harding (68); Nashville Skyline (69); Self Portrait (70); New Morning (70); Pat Garrett and Billy the Kid (73); Planet Waves (74)


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O Dylan que emerge do retiro em Woodstock é, mais uma vez, uma síntese de sua geração - na virada dos trinta anos, casado e pai de família, violentamente confrontado com sua própria mortalidade, ele desacelera, medita, reavalia suas opções. Quando o sereno, semicountry John Wesley Harding é lançado, em 68, parece que Dylan encontrou, enfim, maturidade e serenidade, e está dando um passo adiante num ano ruidoso e explosivo, ano de revolução cultural na China, tumulto estudantil em Paris. Na verdade, Dylan estava apenas ganhando tempo, confessando sua perplexidade diante da quantidade de certezas destruídas que os últimos meses haviam acumulado em sua vida - exatamente como seu público faria durante a nova década, diante de coisas tão desconcertantes quanto a escalada da Guerra do Vietnã, Watergate, drogas pesadas e discoteca.


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Sua primeira reação é voltar atrás, recuperar o fôlego - uma fórmula que, crise após crise, se mostra certeira no pop. John Wesley Harding e Nashville Skyline são discos marcados pela country music, pelo abraçar sem reservas da simplicidade, da rusticidade até. A voz está mais grave, mais doce, a lira está serena: o caipira esclarecido canta a vida e o amor sem pedir desculpas, e flerta com a possibilidade - que depois explorará quase até o delírio - da experiência religiosa como provedora de peso e significado.


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Os outros discos são irregulares - embora a trilha de Pat Garrett oculte um clássico, "Knockin´ on Heaven´s Door" -, Dylan não se apresenta mais ao vivo, brinca de fazer cinema (em Pat Garrett). Sua vida parece ecoar suas canções: "Êi, baby, este será o fim?", ele tinha perguntado, uma vez. Não: novamente, era apenas o início.

(texto de autoria de Ana Maria Bahiana, e publicado originalmente na revista Bizz de janeiro de 1990)